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segunda-feira, 25 de outubro de 2010

ASPECTOS POLÊMICOS DA RECONVENÇÃO NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO

ASPECTOS POLÊMICOS DA RECONVENÇÃO NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO


Artigo do Dr. Mauro Schiavi.
Juiz do Trabalho na 2ª Região. Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP. Professor Universitário (Graduação e Pós-Graduação). Professor dos Cursos Preparatórios LACIER (Campinais) e RORBORTELLA (São Paulo).
Obtido junto ao site:www.lacier.com.br


Conceito e requisitos de admissibilidade

Em certa fase da evolução do Direito romano, eram as partes que convencionavam os limites da controvérsia e a ação (actio) também era conhecida como conventio; se o réu tinha alguma pretensão contra o autor, reagia à demanda com uma reconventio, e daí derivou a denominação atual, reconvenção que corresponde portanto a uma “re-ação” do réu contra o autor .
Conforme a definição de Fredie Didier Júnior , “reconvenção é a demanda do réu contra o autor no mesmo processo em que está sendo demandado. È o contra-ataque que enseja o processamento simultâneo da ação principal e da ação reconvencional, a fim de que o juiz resolva as duas lides na mesma sentença”.
Trata-se de uma modalidade de resposta (artigo 297 do CPC), em que o réu demanda em face do autor, na mesma relação jurídica processual. A natureza jurídica da reconvenção é de uma ação autônoma conexa ao processo.
São requisitos para a admissibilidade da reconvenção:
a)que o juiz da causa principal não seja absolutamente incompetente para a reconvenção; b)haver compatibilidade dos ritos procedimentais; c)haver processo pendente: litispendência; d)haver conexão (artigo 103 do CPC ) entre a reconvenção e a ação principal ou com o fundamento da defesa.
É admissível a reconvenção em ação declaratória (Súmula 258 do STF). A reconvenção não pressupõe, por ausência de previsão legal neste sentido, a natureza condenatória na ação original.
Na fase de execução, não é cabível, pois a reconvenção tem que ser conexa à ação principal ou com o fundamento de defesa. Além disso, na execução não há sentença de mérito e a obrigação já está delineada no título executivo judicial ou extrajudicial.
No processo cautelar, não se mostra cabível a reconvenção, pois o processo cautelar tem por objeto garantir o resultado útil de um processo principal, sendo sua natureza acautelatória e não satisfativa. Portanto, não há como o requerido aduzir pretensão em face do requerente no processo cautelar.
Quanto houver substituição processual no pólo ativo , não cabe a reconvenção por força do que dispõe o parágrafo único do artigo 315 do CPC, “in verbis”: “Não pode o réu, em seu próprio nome, reconvir ao autor, quando este demandar em nome de outrem”.
Renato Saraiva , com suporte em Gregório Assagra de Almeida sustenta que a reconvenção também não é cabível sem sede de ação civil pública, pois poderá impedir a rápida e eficiente tutela dos direitos coletivos, de forma a frustrar os legítimos interesse sociais e tornar o processo coletivo palco de litígios que fogem aos verdadeiros anseios da sociedade.
A reconvenção disciplinada no Código de Processo Civil (artigos 315 a 318) é compatível com o Processo do Trabalho, por omissão da CLT e compatibilidade com os princípios que regem o Direito Processual do Trabalho (artigo 769, da CLT). Entretanto, algumas vozes da doutrina se mostram contrárias à admissão deste instituto na esfera processual trabalhista, argumentando a falta de previsão da CLT, como silêncio intencional e incompatibilidade com a celeridade e simplicidade do procedimento trabalhista . Não obstante, a doutrina majoritária e a jurisprudência consagraram a possibilidade de reconvenção no Processo do Trabalho, uma vez que esta possibilita a máxima eficiência da jurisdição trabalhista, e atende aos princípios da economia processual e acesso à justiça do trabalho.
Nos ritos sumário (Lei 5584/70) e sumaríssimo (lei 9957/00) a reconvenção não se mostra cabível em razão do princípio da celeridade que envolve os ritos processuais destes procedimentos. Não obstante, por aplicação analógica do artigo 31, da Lei 9.099/95 , admite-se o pedido contraposto, que é articulado no próprio bojo da contestação desde que se fundamente nos mesmos fatos objeto da controvérsias. O pedido contraposto é, na verdade, uma reconvenção mitigada, pois sua amplitude é menor que a reconvenção, embora o efeito de tal pedido seja o mesmo da reconvenção.

Do procedimento da reconvenção no Processo do Trabalho
A reconvenção, na esfera processual civil deve ser proposta no prazo da resposta junto com a defesa, em peças separadas, no mesmo dia, sob pena de preclusão consumativa. Como bem adverte Nélson Nery Júnior : “o réu não precisa contestar para reconvir, entretanto, deverá fazê-lo simultaneamente, isto é, na mesma oportunidade processual (CPC 299), em peças autônomas”.
Embora o réu, como regra geral, não precise contestar para reconvir, acreditamos que quando a reconvenção for conexa com os fundamentos da defesa, há essa necessidade. Como bem advertem Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart , “obviamente, para que essa reconvenção possa ser deduzida, é necessário que o réu impugne o pedido do autor, por da contestação. Sem contestação, essa reconvenção não pode ser admitida, já que não haverá conexão com o fundamento de defesa que não existe nos autos”.
No Direito Processual do Trabalho, a jurisprudência tem tolerado que a reconvenção seja aduzida no próprio corpo da contestação em razão do princípio da informalidade que rege o Direito Processual do Trabalho. Pessoalmente, preferirmos que a reconvenção seja apresentada em peça separada, mesmo no processo do trabalho, pois facilita sua tramitação e também trata-se a reconvenção de ação e não defesa . Entretanto, se o artigo 847, da CLT, disciplina que a contestação seja apresentada de forma oral na própria audiência, e como a reconvenção também deve ser apresentada em audiência junto com a defesa, esta pode ser aduzida de forma oral, no mesmo ato e o registro dos dois atos constará da mesma ata de audiência. Sendo assim, não há razão para não se admitir, no processo do trabalho, que a reconvenção seja articulada na própria peça de contestação.
A reconvenção pode ser escrita ou verbal, mas deve observar os requisitos da petição inicial trabalhista elencados no artigo 840, da CLT.
Como no processo do trabalho a reconvenção é apresentada em audiência, o juiz deverá adiá-la para o reclamante (reconvindo) apresentar resposta à reconvenção na próxima audiência, que deverá ser remarcada com antecedência mínima de 05 dias (artigo 841 da CLT). Entretanto, o reclamante pode, se for possível, renunciar o prazo da resposta da reconvenção e ofertar sua reposta na própria sessão da audiência de forma oral .
Se reclamante (reconvindo) não apresentar resposta à reconvenção, aplica-se-lhe a confissão ficta. No nosso sentir, se o reclamante estiver presente na audiência, não há revelia pela não contestação à reconvenção, pois a revelia, no processo do trabalho, esta vinculada à ausência do reclamado na audiência (artigo 844, da CLT).
A compensação, na esfera processual trabalhista, conforme o artigo 767, da CLT, deve ser argüida em contestação, mas se o crédito do reclamado superar o do reclamante, este poderá propor a reconvenção.
Nos termos do artigo 317 do CPC, que se mostra compatível com o Direito Processual do Trabalho, a desistência da ação ou qualquer causa que a extinga não obsta o prosseguimento da reconvenção.
Quanto ao número de testemunhas, se o reclamado optou for formular a reconvenção, não poderá ouvir três testemunhas para comprovar a tese de defesa e outras três para a reconvenção. Acreditamos que, nesta hipótese, o reclamado renuncia ao direito de ouvir outras testemunhas que não as próprias da defesa. Desse modo, o número máximo de testemunha para comprovação dos fatos da contestação e reconvenção é três .
A ação e a reconvenção devem ser julgadas na mesma sentença, nos termos do artigo 318, do CPC, que se mostra compatível com o processo do trabalho. Na parte dispositiva da sentença trabalhista, deve o juiz abrir um parágrafo dizendo sobre a procedência, improcedência, ou procedência em parte do pedido ou pedidos formulados na reconvenção, bem como as condições para o cumprimento. Da decisão que julgar a reconvenção, cabe o Recurso Ordinário, nos termos do artigo 895, da CLT.
No Direito Processual Civil, a doutrina majoritária se firmou no sentido de que do indeferimento liminar da reconvenção cabe Agravo de Instrumento, pois a relação jurídica processual não se encerra . Na esfera do Processo do Trabalho, contra o indeferimento liminar da reconvenção, por se tratar de decisão interlocutória, não cabe recurso (artigo 893, da CLT), podendo a decisão ser questionada quando do recurso ordinário em face da decisão definitiva da Vara.
Nesse sentido, por todos, destacamos a visão de Sérgio Pinto Martins :
“Se, por acaso, fosse indeferida liminarmente a reconvenção, qual seria o recurso cabível? Para nós, nenhum. A decisão que indefere a reconvenção é, no caso, uma decisão interlocutória, dela não cabendo qualquer recurso (p. 1º do art. 893, da CLT). A parte prejudicada poderia ingressar com ação própria, ou aguardar o momento adequado para fazer suas observações no recurso da decisão definitiva, incluindo, então, como preliminar a discussão do indeferimento da reconvenção”.


Da Reconvenção nas Ações de Natureza Dúplice na Esfera Processual do Trabalho

Nos procedimentos especiais, as ações têm a chamada natureza dúplice, qual seja: o demandante pode vir a ser condenado a indenização ou realizar uma prestação em favor do demandado, ainda que este último não tenha feito tal pedido, ou seja, não há necessidade de reconvenção ou de pedido formulado na defesa para se condenar o demandante. Nestas ações, autor e réu ocupam, simultaneamente, as posições de demandante e demandado .
Nesse sentido ensina Antonio Carlos Marcato : “A lei abre, entretanto, a possibilidade de vir o réu a obter tutela jurisdicional ativa favorável sem necessidade de valer-se da reconvenção. É o que ocorre nas denominadas ações dúplices, ou “actio duplex”, nas quais autor e réu ocupam simultanemante e concomitantemente ambas as posições subjetivas na base da relação jurídica processual, podendo o último obter, independentemente de pedido expresso (mas sem prejuízo dele), o bem da via disputado como conseqüência direta da rejeição do pedido do primeiro, v. g., nas ações de possessórias, de prestação de contas e de divisão e de demarcação”.
Como exemplos típicos na esfera do processo do trabalho, temos o Inquérito Judicial para Apuração de Falta Grave (artigos 853 e seguintes da CLT), que é uma ação de rito especial prevista na CLT e a Ação de Consignação em Pagamento, que é prevista no Código de Processo Civil, mas muito utilizada na Justiça do Trabalho.
No Inquérito Judicial para Apuração de Falta Grave com prévia suspensão do empregado, se o pedido do requerente for julgado improcedente, vale dizer: o juiz entender que não houve falta grave, condenará o requerente a pagar ao requerido os salários do período de afastamento, que podem ser executados nos próprios autos de inquérito, sem a necessidade de reconvenção.
Na Ação de Consignação em Pagamento, se o juiz do Trabalho entender que houve insuficiência no valor do depósito, condenará o consignante a pagar ao consignado, nos mesmos atos da consignatória, o valor da diferença.
Discute-se na doutrina e jurisprudência, se a reconvenção pode ser cabível no Inquérito Judicial e na Ação de Consignação em Pagamento na Justiça do Trabalho. Pugnam alguns pela impossibilidade, argumentando que a reconvenção é incabível em tais procedimentos, pela incompatibilidade de ritos processuais e da falta de interesse processual, pois tais ações têm natureza dúplice.
Acreditamos que a reconvenção seja compatível com o Inquérito Judicial para Apuração de Falta Grave, quando o objeto da reconvenção seja mais amplo do que o recebimento dos salários do período de afastamento ou da reintegração do empregado estável, como por exemplo: em razão dos motivos da falta grave, o requerido (empregado), por meio de reconvenção pleiteia a reparação de danos morais e patrimoniais que tenha conexão com a matéria versada no Inquérito.
Já na Ação de Consignação em Pagamento, o consignado pode por meio de reconvenção formular pretensão mais ampla do que a discutida nos autos da consignatória, desde que guarde conexão com os fatos deduzidos na Ação de Consignação. Por exemplo: por meio de reconvenção, o consignado, além de não concordar em receber as verbas rescisórias, formula pedido de reintegração no emprego em razão de doença profissional e indenização por danos materiais decorrentes da alegada doença.
A jurisprudência trabalhista tem admitido a reconvenção tanto no Inquérito como na Consignação, convertendo o rito especial em ordinário, o que, no nosso sentir, está correto, pois facilita o acesso do trabalhador à justiça, e também prestigia os princípios da efetividade e celeridade processual, bem como evita decisões conflitantes sobre a mesma matéria na mesma Vara do Trabalho.

Reconvenção de Reconvenção no Processo do Trabalho

Questão das mais polêmicas diz respeito à possibilidade da existência da reconvenção de reconvenção.
Parte da doutrina não a admite, argumentando que tal atitude provoca complicadores excessivos no processo; atenta contra a celeridade processual e ainda propicia uma chance a mais ao autor, que deveria ter formulado todos os seus pedidos no próprio corpo da inicial (princípio da eventualidade da inicial).
Calmon de Passos aponta os seguintes argumentos favoráveis à admissão da reconvenção de reconvenção: “a)o autor ignorava que o réu iria reconvir; e por outro lado o seu interesse pode ter surgido justamente em razão da reconvenção; mas, ainda que o soubesse, a cumulação dos pedidos não é dever de ordem substancial nem de natureza processual; b)as ações entre só duas partes são em número finito e logo se exaurem; inclusive a exigência de um nexo entre a ação e a reconvenção ainda opera como fator limitativo de maior eficácia; c)a impugnação da reconvenção contestação é (hoje, inclusive, e assim denominada) sob qualquer aspecto que seja examinada”.
A reconvenção é uma modalidade de resposta (artigo 297 do CPC). Portanto, uma vez respondendo a reconvenção, o autor (reconvindo) pode aduzir outra reconvenção em face do réu (reconvinte). A Lei não veda a reconvenção de reconvenção e autores de nomeada como Pontes de Miranda, Calmon de Passos e Cândido Rangel Dinamarco a admitem.
Os argumentos apontados por Calmon de Passos nos convencem sobre a admissibilidade da reconvenção de reconvenção no Processo Civil e acreditamos que tal instituto se aplica também ao Processo do Trabalho, em razão de omissão da CLT e compatibilidade com os princípios do Direito Processual do Trabalho (artigo 769, da CLT).
Pode-se questionar a aplicabilidade da reconvenção de reconvenção no Processo do Trabalho em razão dos princípios da celeridade, e informalidade do procedimento trabalhista e por trazer ao processo complicadores que podem comprometer seu bom andamento . Em razão disso, acreditamos que embora seja possível a reconvenção de reconvenção no processo do trabalho, o Juiz do Trabalho, valorando o custo benefício em se admitir uma reconvenção de reconvenção pode indeferi-la se provocar uma demora excessiva no andamento do processo ou complicadores excessivos na relação jurídica-processual.

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